quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O Cronista do Boato

Foi uma festa. Uma festa do resgate. Uma festa da memória, in memoriam. Uma festa do reencontro. Uma festa para celebrar os “causos de Valiomar Rolim”, que desta vez não era boato, mas uma festa de verdade. A sua família, tendo a frente a sua irmã Vilmar Rolim fez o que Valiomar, já teria feito se vivo estivesse: reunir suas crônicas, muitas já publicadas em jornais da Paraíba e transforma-las num “delicioso” livro: “O Cronista do Boato – Causos de Valiomar Rolim”, editado pela Moura Ramos, da cidade de João Pessoa.

O lançamento do livro foi realizado na sede do Rotary Clube de Cajazeiras, na Avenida Comandante Vital Rolim e contou com a presença de amigos de Valiomar, muitos de outras cidades, inclusive do Recife, Rio de Janeiro e João Pessoa. Foi uma festa do reencontro dos amigos comuns de Valiomar.

Valiomar em seus “boatos” fez estória e história da terra que lhe serviu de berço. Cajazeiras era o centro de suas atenções, o seu universo, a sua guarida, o seu porto seguro e onde seu coração palpitava acima do normal.
A narrativa de suas crônicas retrata o cotidiano da cidade, esbugalha os personagens mais simples, mais humildes e nelas esconde o riso até o momento final da leitura de cada“boato” que tornava uma realidade no sabor de suas palavras escritas.

Toinha 99, João de Manezim, o guarda Tibúrcio, Zé de Sousa, Zé das Chaves, o não menos famoso Zecão, Neco de Luiz Pezinho, Dedé Bundão e tantos outros cajazeirenses foram brilhantemente lembrados através dos “boatos” de Valiomar. Estes ilustres personagens não poderiam ficar no anonimato, sem um registro histórico nas estórias de Valiomar. Que contribuição valiosa deu Valiomar à História do Cotidiano de nossa urbe.
Rir, rir e rir. Esta é uma constante nos escritos de Valiomar, nos seus causos vivenciados nas paisagens que ficaram marcadas profundamente em sua memória. Não esqueceu os grandiosos e exuberantes cenários de sua cidade, quando de forma carinhosa e telúrica vai fazendo narrativas e enquadrando os seus personagens em cada um deles: o Açude Grande, (por que este açude que não é grande tem uma magia tão grande sobre todo filho de Cajazeiras?), o Tênis Clube, o Clube 1º de Maio, o sesquicentenário Colégio Diocesano, o Sitio Olho Dágua do Melão, a Praça Presidente João Pessoa, o Bar Centenário, a Rua Victor Jurema e outros logradouros da cidade.

Mas Valiomar também introduz nos seus causos figuras importantes da cidade, a exemplo do Bispo Zacarias, do Mons. Vicente Freitas, Dr. Waldemar Pires, Ica Pires, seu tio Chico Rolim, Epitácio Leite, todos envolvidos como personagens de suas envolventes crônicas.

Valiomar não deixou de lado sequer os membros da sua família, motivo de suas telúricas e fraternas narrativas quando suas palavras, em verdadeiros turbilhões, pincelam com amor e carinho, os momentos mais descontraídos vividos no seio da família.

Valiomar se sobressai quando envolve os seus contemporâneos de escolas, de agremiações e de trabalho: Ferreirinha, Luluzinha, Boinho, Rafael Holanda, Neto Xavier, Hora Certa, Galego Capita, Roosevelt Leitão, Mosquito, Dienner, Zélio Furtado, Gutemberg Cardoso, Nonato Guedes, Bira Assis, Luis Alves, Lena Guimarães e mais uma dezena de grandes e fraternos amigos, enquanto moleque, estudante e médico conquistou de coração e simpatia.

Valiomar também defendeu e abraçou através de suas crônicas as grandes causas da terra que lhe serviu de berço, muitas com profunda indignação e revolta, outras mostrando os caminhos para que sua cidade pudesse adquirir o status de melhor da Paraíba, motivo que o orgulhava muito.
A família está de parabéns pelo lançamento do livro que Valiomar tanto sonhou. Na próxima edição, agora com mais tempo, vamos garimpar mais uma dezena de crônicas que não foram publicadas e incluí-las.
Agora Valiomar conta os seus boatos no céu, gloriosamente.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Valiomar Rolim e Nêgo Rúbi, irmão de Nenen Labirinto.


Esteve sempre antenado com as coisas de sua terra e dela e seu povo herdou o espírito buliçoso e gaiato. A sua gaiatice não se traduziu em grandes estórias suas, de participação especial, de protagonista, mas poucos souberam divulgar com a sua mestria as descrições do espírito cajazeirense, naqueles tons de alegria e saudade, fincados na existência concreta dos personagens.
Nos seus últimos anos de vida, Valiomar explorou, intensamente, o seu retorno espiritual e intelectual às coisas de Cajazeiras.
Por isto, passou a escrever em jornais as suas colunas dos nossos personagens da boa terra.
Para mim, ler o seu texto seguro, fácil, bem escrito e fiel à estória, era um prazer de grande escala. Via-me nas esquinas e calçadas cajazeirenses, bebendo a realidade de minha terra e de sua gente. Relembrava-me a sua imagem de boa pessoa risonha, de riso largo e generoso, dramatizando um fato, um personagem e colhendo, nos seus interlocutores, a alegria decorrente de uma grande narrativa jocosa.
Fomos de gerações distintas, mas cheguei a conviver com ele nos seus tempos de AUC (Associação Universitária de Cajazeiras). Ele me deu atenção, confiança e respeito. Foi assim no nosso tempo de mais juventude e se reiterou no nosso tempo de menos juventude.
Lembro-me de sua época de presidente da AUC. Semana Universitária das boas. Muitas atividades sócio-esportivas.
Numa delas, um churrasco na fazenda de finado Arcanjo.
Valiomar estava dividido entre o churrasco e uma corrida de motocross. Tinha que cuidar da organização dos dois eventos.
Quando ele chegou no churrasco, a festa já corria solta. Tinha música, cerveja e...churrasco. E gente muita!

Valiomar viu que tudo estava caminhando bem e resolveu voltar para Cajazeiras e vistoriar a tal corrida de motocross. Me chamou para voltar com ele e dar apoio ao outro evento.
Quando íamos em direção ao seu carro, um grande personagem cajazeirense, o nosso Nêgo Rubens, mais conhecido como o irmão de Nenen Labirinto (outro presepeiro de Cajazeiras) pediu uma carona e entrou conosco no automóvel.
Caimos na estrada. De terra e estreita. E Valiomar inventou de dirigir ligeiro, muito ligeiro - estava atrasado.
Nêgo Rubens - chamamos Nêgo Rúbi - morria de medo de carro veloz!
Fomos, então, Valiomar na direção, eu de carona, na frente, e Nêgo Rúbi no banco traseiro, na parte central.
Valiomar tinha um chevette novo e corredor. E deu vontade de fumar, mas não tinha o fósforo.
Por isto, ele pegou o cigarro e virou-se para o banco traseiro: "- Tem fósforo, aí, Nêgo Rúbi?"
Nêgo Rúbi tinha o fósforo, mas estava com dificuldades de encontrá-lo, já que o carro em alta velocidade balançava demais. Só respondeu a Valiomar dizendo; "- Tenho, mas olhe pra frente que eu dou!"
E tome velocidade! Nêgo Rúbi demorou a entregar o fósforo e Valiomar fez aquele movimento de se virar pra trás umas três vezes! "- Me dá o fósforo, aí, Nêgo Rúbi!"
Como Nêgo Rúbi toda vez só dizia " - olhe pra frente, que eu dou", Valiomar perguntou: "- oxênte, Rúbi, tá com medo?"
Nêgo Rúbi faz um esforço maior e coloca o corpo entre os dois bancos dianteiros do carro e começa a apontar pra cima, pro céu, onde voavam vários urubus. E então diz: "- Num sou eu, não, Valiomar. São eles! Um dono de jogo do bicho resolveu colocar eles no jogo e quebrou 17 vezes!"
Eu e Valiomar caímos na risada! Nêgo Rúbi é temeroso ao azar que o urubu provoca!

Oh! Carrazera boa!
Saudade de Valiomar!
 Fonte: Blog Sete Candeeiros Cajá